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Violência contra a mulher no Brasil: por que não posso ficar calado

(Foto: Rafa Dotti)

Eu sou pai da Alice — uma moça com sonhos, desejos e vida. Como muitos pais e mães, acredito na dignidade, no respeito e na equidade entre todas as pessoas. Diante da realidade de tantas mulheres que sofrem — e morrem — por serem simplesmente quem são: não posso, e não vou, ficar calado.

A gravidade dos números

O fenômeno do feminicídio — assassinato de mulheres pelo fato de serem mulheres — continua sendo uma chaga no Brasil. Segundo dados de 2023 do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), foram registrados 3.903 feminicídios no país.

Em relação a violência doméstica, um estudo nacional de 2019 (o mais recente da série disponível publicamente) indicou que 29,7% das mulheres adultas brasileiras relataram já terem sofrido pelo menos uma forma de violência (física, sexual ou psicológica) por parceiro íntimo ao longo da vida.

O número de denúncias registradas por meio da central de atendimento Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180 mostra que milhares de pedidos de ajuda e denúncias são feitos anualmente, evidenciando a escala do problema.

Especialistas e organizações alertam que os dados oficiais subestimam o problema: muitas mulheres nunca denunciam — por medo, vergonha, dependência econômica, falta de confiança no sistema de proteção ou medo de retaliação — o que indica que a violência é ainda maior do que relatam as estatísticas conhecidas.

A violência se manifesta de múltiplas formas — física, psicológica, sexual, patrimonial — e em diferentes ambientes: em casa, no trabalho, nas ruas, no ambiente virtual. Isso mostra que é um problema estrutural, que atravessa todas as camadas da sociedade.

O que está por trás dessa violência

A visão patriarcal e machista de que a mulher é “posse”, “objeto”, “propriedade” — e não sujeito de direitos e escolhas. Essa concepção reduz a mulher a papel de subordinação, legitima controle e dominação, tolhe a liberdade.

A cultura da dominação: “homem manda, mulher obedece”. Mesmo disfarçada de “amor”, “proteção” ou “cuidado” — essa cultura corrompe o respeito, a liberdade, a autonomia.

A falta de educação para a igualdade desde a infância. Quando meninas e meninos crescem ouvindo que papéis de gênero definem quem manda, quem obedece — aprendem que desigualdade e preconceito são normais. Isso perpetua o ciclo de violência e discriminação.

Educação e respeito desde cedo: a semente da mudança

A transformação começa em casa — e deve se expandir pela escola, comunidade, espaços de convivência social e instituições como igrejas.

É urgente ensinar desde criança que:

Todo ser humano merece respeito — independentemente de gênero, cor, origem, orientação.

A mulher não é objeto, não é posse, não pertence a ninguém. Ela é dona de si — de seus sonhos, decisões, corpo e voz.

Autonomia é direito: ela pode dizer “não”, pedir ajuda, decidir — viver, amar, sair de relações abusivas — com dignidade.

Empatia, igualdade e solidariedade devem reger a convivência — não dominação, medo ou desigualdade.

Propostas para combater o feminicídio e proteger vidas

Para além da denúncia e da conscientização — precisamos de ações concretas. Algumas propostas:

1. Educação sobre gênero desde a infância

Incluir nas escolas — desde os primeiros anos — projetos educativos sobre igualdade de gênero, respeito e direitos humanos.

Promover conversas abertas em família sobre valores, respeito, empatia e igualdade.

2. Campanhas públicas de conscientização

Campanhas em escolas, comunidades, igrejas e espaços de convivência — para desconstruir estereótipos e ideias machistas.

Incentivar homens a refletirem sobre masculinidade, privilégio e poder — mostrando que apoiar a igualdade não diminui ninguém.

3. Fortalecimento de políticas de proteção

Promover serviços públicos de acolhimento, apoio psicológico e social, assistência às vítimas de violência.

Garantir linhas de denúncia acessíveis, proteção efetiva às mulheres em risco, políticas de prevenção e acompanhamento.

4. Justiça eficaz e rigor contra agressores

Assegurar que casos de violência, abusos e feminicídios sejam investigados com seriedade.

Combater a impunidade — para que haja punição, responsabilização e prevenção de novos crimes.

5. Mobilização da sociedade — homens, mulheres, famílias, comunidades

Homens participando ativamente na defesa da igualdade e dos direitos das mulheres.

Pais e mães ensinando às crianças: respeito, dignidade, igualdade; meninas confiantes de seu valor; meninos respeitosos em relação a todas as diferenças.

Comunidades unidas contra o machismo, a opressão, a violência.

Conclusão: responsabilidade de todos

O feminicídio e a violência contra a mulher não são “problemas delas” — são de toda a sociedade.

Como pai da Alice — e também em relação a meninas e mulheres que conheço — sinto que meu dever é cuidar, ensinar, proteger, lutar.

Por isso, exijo: respeito à mulher. Equidade. Autonomia. Dignidade. Justiça.

E te convido — você que lê — a levantar a voz, somar à luta, educar com amor e justiça.

Não ao silêncio. Não à omissão.

Sim à vida. Sim ao respeito. Sim à igualdade.

Professor Toni Reis

Doutor em Educação

Diretor-presidente da Aliança Nacional LGBTI+

Toni Reis

Ativista LGBTI+, cofundador da ABGLT e do Grupo Dignidade. Diretor da Aliança Nacional LGBTI+, professor e autor premiado em direitos humanos.

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