O filme catarinense “Virtuosas”, dirigido por Cíntia Domit Bittar, terá sua estreia mundial no Festival do Rio 2025, maior encontro de cinema da América Latina. Filmado em Florianópolis (SC), o longa será exibido na Mostra Competitiva “Première Brasil: Ficção”, principal vitrine do evento, com sessões marcadas para os dias 10, 11 e 12 de outubro. A obra é produzida pela Novelo Filmes, com produção associada da Cajamanga e coprodução da Olhar Filmes.
Cíntia Domit Bittar contou que, embora o longa já tivesse sido apresentado em Cannes, a exibição ocorreu no evento de mercado do festival, o Marché du Film, no programa Goes to Cannes, que traz filmes em pós-produção de cinco países diferentes. No caso do Brasil, a curadoria dos cinco filmes foi do Festival do Rio, através de edital do Ministério da Cultura (MinC) para a composição da delegação brasileira no evento. Entre os vinte e cinco filmes participantes, Virtuosas foi o vencedor.

“Nós preferimos aproveitar esse ciclo deste ano ainda para fazer a estreia no Brasil. Quisemos fazer a estreia em casa”, explicou a diretora.
Segundo ela, a expectativa para as sessões no Rio mistura “uma felicidade muito grande” com curiosidade em relação à recepção da obra.
“O Festival do Rio é uma das mais importantes vitrines do cinema brasileiro. Eu espero que gere muito público para sentirmos qual é a reação desse público. O trecho que a gente exibiu em Cannes já deu para ver que é um filme que a plateia interage bastante, então, quero ver como vai ser no Rio”, ressaltou.

Sobre o reconhecimento em Cannes, a cineasta lembrou que o prêmio foi uma surpresa e uma conquista especial.
“Foi uma alegria muito grande, imensa. O que a gente acredita que fez o filme levar o prêmio foi o tema que ele aborda e a abordagem dentro do cinema de gênero para esse tema. E foi realmente bastante inusitado, porque foi a primeira vez que fomos foi para Cannes também”, acrescentou.
Cíntia ressaltou ainda a importância de o Brasil ter sido o País de Honra em Cannes em 2025, o que deu visibilidade ao projeto.
Foi muito bom pro filme estar nesse meio, tanto por ser brasileiro, num ano histórico como esse, quanto pelo evento em si. Trouxe uma atenção muito grande ao filme, isso é bom, porque muita gente já vai com a curiosidade de assistir ele no Festival do Rio”, disse.
Enredo e personagens

Virtuosas se passa em um retiro VIP para mulheres que buscam sua “melhor versão”. O encontro, inicialmente conduzido como uma imersão espiritual, logo descamba para o absurdo e o terror, expondo tensões relacionadas à repressão, ao controle e à fé. No elenco principal estão Bruna Linzmeyer, Maria Galant e Juliana Lourenção. Linzmeyer interpreta Virgínia, uma coach que direciona seus ensinamentos a mulheres conservadoras, pregando valores da chamada “mulher virtuosa” e seu papel na família e na sociedade. A cada cena, cresce a inquietação e o fascínio diante das atitudes das personagens, até a revelação de até onde podem chegar. O elenco ainda conta com Sarah Motta, Brisa Marques, Nenê Borges, Fernando Bispo e participação especial de Gabriel Godoy.
A diretora contou que a inspiração para Virtuosas surgiu do desejo de refletir sobre o negacionismo, algo que, segundo ela, está profundamente ligado à pauta ultraconservadora. Nesse processo, decidiu criar um filme protagonizado por mulheres e mergulhou em uma extensa pesquisa.
“Essa história partiu de um de um desejo de falar sobre o negacionismo que está muito alinhado à pauta ultraconservadora. Eu queria ter personagens mulheres e eu pesquisei ao longo dos anos o termo traditional wife, mas eu não encontrava muito esse tema explorado no Brasil. Diante de uma pesquisa extensa, eu entendi que uma expressão que muito se aproxima desse conceito, que é usada muito nos Estados Unidos e Europa, é a da mulher virtuosa”, disse.
“Eu quis abordar esse conceito da mulher virtuosa, mas com elas tendo essa essa questão negacionista para além das dos valores tradicionais do que elas consideram que uma mulher deve ter. É claro, nem todas as mulheres que se declaram virtuosas são negacionistas e tudo mais. Mas o filme promove esse recorte dentro desse grupo de mulheres”, complementou.
Segundo a diretora, a ideia da “mulher virtuosa”, embora pouco conhecida por muitos, é recorrente em contextos conservadores. Para Cíntia, trazer esse contexto para a narrativa do filme, associado ao negacionismo, confere ao longa um frescor e uma perspectiva pouco explorada no cinema nacional.
“Quis trazer essa contemporaneidade num filme que é um terror psicológico, que tem muitos elementos do absurdo, do humor ácido e da tragédia. O filme é bastante contemporâneo nesse sentido. Temos visto muitos filmes que de certa forma são erguidos numa mescla desses gêneros. E também porque o terror é muito amplo, ele pode ser tudo isso também”, comentou.
Um olhar feminino sobre o terror
O filme promove uma narrativa de suspense marcada por humor ácido, desconforto crescente e um final amargo. Para Bittar, um dos pontos centrais de Virtuosas é a construção de personagens femininas complexas. A diretora afirma que sua visão feminista no cinema não está em criar apenas mulheres heroínas ou sobreviventes, mas em trazer profundidade e contradição às personagens.
“É importante termos no terror personagens mulheres complexas também, o que eu chamo de monstruosamente humanas. Isso faz parte da proposição de uma visão feminista para o cinema. Porque você ser uma mulher cineasta, escrever personagem mulheres, não quer dizer que essas mulheres têm que sempre ter boa índole, que têm que ser boas, salvadoras ou sobreviventes. Quer dizer que você tem que construir personagens sólidas, complexas e coerentes com aquilo que elas são, independente da sua índole. Isso ajuda muito o cinema que se diz feminista”, enfatizou.
Produção e distribuição
O longa foi viabilizado por meio do Prêmio Catarinense de Cinema, da Lei Paulo Gustavo e do Fundo Setorial do Audiovisual (FSA). A distribuição é da Olhar Filmes.
Sessões no Festival do Rio:
• 10 de outubro, às 19h15 – Estação NET Gávea
• 11 de outubro, às 13h30 – Cine Odeon
• 12 de outubro, às 18h45 – Cinesystem Belas Artes
Festival do Rio 2025
A 27ª edição do Festival do Rio acontece de 2 a 12 de outubro e reúne cerca de 300 filmes nacionais e internacionais. Além da Mostra Competitiva, a programação inclui exibições gratuitas, sessões acessíveis, mostras paralelas, homenagens e estreias aguardadas. As galas de abertura e encerramento serão realizadas no Cine Odeon – CCLSR, mas a programação também se espalha por salas como Estação NET, Kinoplex São Luiz, Reserva Cultural Niterói, Cine Santa, Cine Carioca José Wilker e pelo Circuito Carioca da Prefeitura. A programação completa pode ser acessada no site festivaldorio.com.br.
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