Nesta semana, de 6 a 10 de agosto, Curitiba (PR) será palco de uma das maiores mobilizações em torno da agroecologia no país. A Jornada de Agroecologia vai muito além de um simples evento: ela simboliza mais de 20 anos de resistência e articulação coletiva entre movimentos camponeses, povos indígenas, comunidades quilombolas, estudantes, pesquisadores, organizações populares e a sociedade civil. A programação, com acesso gratuito, acontecerá no Campus Politécnico da Universidade Federal do Paraná (UFPR), localizado no bairro Jardim das Américas.
Neste ano, serão mais de 50 conferências, oficinas e seminários, além de apresentações culturais de artistas populares, como o rapper Yago Oproprio. Também haverá a tradicional Feira da Agrobiodiversidade, o espaço de culinária da terra, o Túnel do Tempo com memória da luta camponesa, e um grande ato de abertura com a Marcha por Terra, Teto e Agroecologia.
Mais uma vez, vamos trazer a arte camponesa para a cidade, para dentro do espaço acadêmico, mas também teremos apresentações diversas e variadas, de nível nacional, para agradar todos os gostos urbanos
destaca Adriana Oliveira, coordenadora da Jornada.
Alguns dos destaques das conferências são o teólogo Leonardo Boff; João Pedro Stédile, da direção nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST); e Makota Celinha, do Centro Nacional de Africanidade e Resistência Afro Brasileira (Cenarab). A cultura também é protagonista: a programação artística reunirá Ivan Vilela, Antonio Gringo, Cacique e Pajé, Janine Mathias, Dow Raiz, Bloco Afro Pretinhosidade e a Roda de Samba da Resistência. A feira e a culinária da terra estarão abertas ao público durante todo o evento.
Para Adriana, essa edição é mais uma demonstração da força da agroecologia como modelo de resistência e transformação. Ela relembra que, mesmo após mais de 20 anos, o cenário ainda é desafiador.
A agroecologia brasileira continua enfrentando barreiras muito fortes que impedem a sua popularização e que os alimentos de verdade cheguem ao prato dos brasileiros. Isso porque, o modelo de agricultura que se contrapõe à agroecologia é o do agronegócio, que envolve produtores muito ricos e que utilizam desta concentração de capital para vender a ideia de algo ‘pop, tech’, mas que possui uma série de subsídios e insumos que permitem os alimentos serem produzidos a um custo infinitamente mais baixo
destaca.
Segundo ela, essa lógica esconde consequências graves, como alimentos cheios de agrotóxicos que vão parar no prato das pessoas, gerando uma série de doenças, comprometendo a saúde da população. Por isso a importância de debates envolvendo temas como a agroecologia.
Ela traz benefícios diretos para a saúde humana. Ao evitar o uso de pesticidas e fertilizantes sintéticos, os produtos cultivados de forma agroecológica são geralmente mais saudáveis e livres de resíduos químicos. A agroecologia também desempenha um papel crucial na conservação da biodiversidade. Ao promover a diversidade de culturas e a integração de práticas que respeitem os ecossistemas locais, essa abordagem ajuda a preservar espécies vegetais e animais que são essenciais para a saúde do planeta
explica.
Adriana destaca que, entre os valores que movem o encontro, está a conexão entre produção de alimentos, saúde, meio ambiente e justiça social, tudo isso, conectado por meio da agroecologia.
Essa abordagem busca promover a produção de alimentos de forma que respeite os ciclos naturais, utilizando técnicas que minimizam o uso de insumos químicos e que priorizam a biodiversidade. A agroecologia não se limita apenas à produção, mas também envolve aspectos sociais e econômicos, promovendo uma relação mais equilibrada entre o ser humano e o meio ambiente
reforça.
Arte, expressão popular e luta




A Jornada também reafirma que cultura é território. A arte, a memória e a expressão popular são pilares da luta por terra e vida digna.
Um povo sem memória, sem cultura é um povo fácil de ser dominado. Os nossos acampamentos, assentamentos e escolas do campo pulsam, dia e noite, a arte e a cultura camponesa. A jornada, como grande acontecimento que une campo e cidade, traduz um pouco deste sentimento e aproveita para trazer essa simbiose que apresenta, no meio urbano, a riqueza e o pulsar da cultura e da arte camponesa e, ao mesmo tempo, absorve a arte urbana como mecanismo potente de representação das inquietações de um povo
reafirma Adriana.
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O resultado desta mistura se consolida e faz presente no decorrer do ano, quando surgem grupos de cultura cada vez mais ecléticos nos territórios da reforma agrária.
Hoje em dia já vemos os filhos dos camponeses cantando rap, valorizando a pintura. Também é possível ver o avanço do muralismo dentro dos nossos territórios. Vemos surgir expressões coletivas como a Orquestra Camponesa, que vem crescendo e ganhando destaque na cena cultural, entre outras tantas iniciativas de fortalecimento da cultura
destaca.
A cena cultural se fortalece e nos ensina muito sobre pertencimento, apropriação, empoderamento e todas essas coisas legais que a arte proporciona. A gente aprende e ensina, numa troca infinita em que todos ganham
complementa Adriana.
No diálogo entre campo e cidade, ciência e prática popular, a universidade assume papel estratégico. A Jornada tem se mostrado um espaço fundamental não apenas para aproximar o campo da cidade, mas também para promover a integração entre os conhecimentos acadêmicos e científicos, as práticas populares e os saberes ancestrais.
Essa união tem gerado resultados significativos ao longo do tempo, como a produção de teses, dissertações e defesas acadêmicas, além de melhorias concretas em diversas áreas. Muitas dessas transformações começaram com uma simples troca de experiências e se revelaram soluções mais eficazes.
Precisamos apostar nessas iniciativas que estão em curso no Brasil e romper com a grade e o estudo disciplinar engessados, apresentando novas tendências, possibilidades e opções para um futuro cada vez mais sustentável
explica Adriana.
Histórico
Criada no Paraná em 2001, a Jornada cresceu e se transformou em uma referência nacional. A cada edição, promove trocas de experiências entre quem vive e constrói a agroecologia no dia a dia.
Adriana aponta que isso também fortalece os movimentos populares, tanto no campo quanto na cidade. Além de mobilizar os produtores, ela explica que a Jornada se articula com instituições e políticas públicas:
A Jornada busca a abertura de diálogos com representantes dos órgãos públicos responsáveis e outras entidades de incentivo, buscando ampliar as linhas de crédito e o acesso a recursos financeiros e tecnológicos, que possibilitem a ampliação da produção para que os alimentos produzidos priorizem a saúde nutricional da população
explica Adriana.
Outro ponto importante é a crescente aproximação entre o setor acadêmico e os produtores agroecológicos. Segundo Adriana, essa articulação tem permitido a troca de saberes e o desenvolvimento de métodos inovadores voltados à produção de alimentos saudáveis. A colaboração entre teoria e prática fortalece um modelo agrícola menos exploratório, mais sustentável e capaz de oferecer alimentos mais ricos em nutrientes à população. Essa união de expertises amplia o alcance das práticas agroecológicas e contribui para a construção de um sistema alimentar mais justo e equilibrado.
Muito mais do que unir campo e cidade, a Jornada também é um espaço que aproxima os conhecimentos acadêmicos e científicos das práticas populares, dos saberes ancestrais e esta união já trouxe muitos resultados positivos, como teses, dissertações, defesas, assim também como já resultou em uma série de melhoramentos práticos que se iniciaram através de uma simples troca de experiência e se mostraram muito mais eficazes
detalha Adriana.
Por fim, ela compartilha o sentimento que move todas as etapas de organização da Jornada.
BookmarkEstamos plantando com muito carinho a ideia de um novo sistema de produção agrícola que se baseie na valorização da vida, da alimentação livre de venenos e que priorize o bem-estar do ser humano
completa.