Em um cenário de precarização extrema do trabalho, a Câmara dos Deputados resolveu trabalhar, além de ficar pedindo anistia para golpista, e aprovou a urgência para a votação do PL 1.579/2025, que institui um vale-refeição mínimo de R$ 20 para entregadores de aplicativo. A ampla margem de votos (300 a favor e 99 contra) sinaliza um raro consenso sobre a urgência de regular uma atividade que se expandiu sob a promessa de flexibilidade, mas que na prática consolida uma nova forma de exploração da força de trabalho.
O projeto, de autoria das deputadas Talíria Petrone (PSOL-RJ) e Juliana Cardoso (PT-SP), enfrenta de frente uma contradição brutal do capitalismo de plataforma: enquanto gigantes do setor acumulam lucros bilionários, três em cada dez entregadores , conforme revelado pelo estudo “Entregas da Fome”, da Ação da Cidadania, vivem em situação de insegurança alimentar. São trabalhadores que passam fome literalmente carregando comida para outros. A ironia é tão cruel quanto reveladora.
A exigência de vale-refeição após quatro horas ininterruptas ou seis horas intercaladas de trabalho é um reconhecimento tácito de que essas jornadas, frequentemente superiores a nove horas diárias, são exaustivas e incompatíveis com a possibilidade de uma alimentação adequada. O argumento das empresas de que os entregadores são “parceiros autônomos” cai por terra quando a realidade impõe a necessidade de direitos trabalhistas básicos, como o direito de se alimentar durante a labuta.
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A aprovação da urgência, permitindo que o projeto pule as comissões e vá direto ao plenário, é tanto uma estratégia política para acelerar sua vigência quanto um reconhecimento de que a situação demanda ação imediata. No entanto, também levanta questões sobre a profundidade do debate — usualmente aprofundado nas comissões temáticas — em um tema complexo que envolve a regulação de um setor economicamente poderoso e resistente a custos adicionais.
A objeção de quase cem deputados, majoritariamente alinhados à extrema-direita aponta mais uma vez que os interesses dessa ala política é lamber os privilégios de big techs bilionárias.
O PL 1.579/2025 não resolve sozinho o problema estrutural da precarização no trabalho de plataforma. Ele não aborda questões cruciais como vínculo empregatício, remuneração justa por entrega, proteção contra acidentes ou acesso a saúde. Mas é um começo.
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